terça-feira, 22 de setembro de 2009

DIREITO DAS SUCESSÕES – Aula 09

DIREITO DAS SUCESSÕES – Aula 09
Disposições Testamentárias
Disposições testamentárias são as cláusulas do testamento onde o falecido dá destino a seus bens, instituindo herdeiros e legatários. Podemos sintetizar , dizendo que é o conteúdo interno do testamento.
O Código Civil trata de seu conteúdo, estabelecendo o que pode e o que não pode conter (regras permissivas e proibitivas) e como deve ser interpretada a vontade do testador ( regras interpretativas).
Nosso legislador do Código Civil tenta ajudar o juiz e os herdeiros a interpretar, explicar e aplicar as cláusulas do testamento.
Regras gerais :
I – O que não estiver no testamento não tem validade, assim não adianta o nome do herdeiro constar de uma escritura pública, de uma procuração, de uma declaração perante um juiz, se não estiver determinadas no testamento;
II – A designação de legatário sempre é expressa, mas o herdeiro pode ser tácito , conforme dispõe os artigos 1906,1966 e 1788.
Art. 1.906. Se forem determinadas as quotas de cada herdeiro, e não absorverem toda a herança, o remanescente pertencerá aos herdeiros legítimos, segundo a ordem da vocação hereditária.
Art. 1.966. O remanescente pertencerá aos herdeiros legítimos, quando o testador só em parte dispuser da quota hereditária disponível.
Art. 1.788. Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o testamento caducar, ou for julgado nulo
III - O testamento pode ter cláusulas extra-patrimoniais como já dito na aula 7 (ex: art. 14 e parágrafo único).
Art. 14. É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte.
Parágrafo único. O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo.
IV – Respeito à vontade do falecido ( artigos 112 e 1899 )
Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.
Art. 1.899. Quando a cláusula testamentária for suscetível de interpretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da vontade do testador.
V – O artigo 1902 e 1903 procura suprir a omissão do testador na indicação precisa dos beneficiários, dispondo que a disposição geral em favor dos pobres, mas não disse exatamente em favor de quem, deverá ser entendido que quis beneficiar os pobres do lugar de seu domicílio, preferindo a instituição particular à pública.
Art. 1.902. A disposição geral em favor dos pobres, dos estabelecimentos particulares de caridade, ou dos de assistência pública, entender-se-á relativa aos pobres do lugar do domicílio do testador ao tempo de sua morte, ou dos estabelecimentos aí sitos, salvo se manifestamente constar que tinha em mente beneficiar os de outra localidade.
Parágrafo único. Nos casos deste artigo, as instituições particulares preferirão sempre às públicas.
Art. 1.903. O erro na designação da pessoa do herdeiro, do legatário, ou da coisa legada anula a disposição, salvo se, pelo contexto do testamento, por outros documentos, ou por fatos inequívocos, se puder identificar a pessoa ou coisa a que o testador queria referir-se.
VI – Se o testador nomear vários herdeiros, sem definir exatamente a parte ou quinhão de cada um, presume a lei que entre eles deva ser feita a divisão igualitária da herança ( 1904).
Art. 1.904. Se o testamento nomear dois ou mais herdeiros, sem discriminar a parte de cada um, partilhar-se-á por igual, entre todos, a porção disponível do testador.
Espécies de disposições :
I – Simples : é a cláusula pura, sem imposição de qualquer condição ou restrição, possuindo eficácia imediata face ao princípio da Saisime, ou seja, produz seus efeitos logo que se abre a sucessão. A legítima do herdeiro necessário deve sempre ser simples.
Art. 1.897. A nomeação de herdeiro, ou legatário, pode fazer-se pura e simplesmente, sob condição, para certo fim ou modo, ou por certo motivo.
II – Condicional : sob condição, quando sua eficácia fica subordinada a evento futuro e incerto. Ex : deixo minha biblioteca para minha sobrinha se ela se formar em Direito; trata-se do direito eventual a um legado condicionado a um acontecimento futuro e incerto; se a sobrinha morrer antes de se formar não terá herdado nada.
III- A termo ou prazo: uma disposição a termo, com prazo, só vale para legatários (1.924), pois para herdeiros é nula (1.898; ex: não se pode nomear alguém seu herdeiro por dez anos, pois uma vez herdeiro, sempre herdeiro, mas um legado pode ser por prazo certo); enquanto a condição ou o termo não chegam, os bens ficam com os herdeiros legítimos; o único caso de prazo para o herdeiro é no fideicomisso, que veremos em breve; lembro que se um herdeiro for nomeado a prazo, fora dos casos de fideicomisso, esse prazo não será considerado e a herança será tida como simples.
Art. 1.924. O direito de pedir o legado não se exercerá, enquanto se litigue sobre a validade do testamento, e, nos legados condicionais, ou a prazo, enquanto esteja pendente a condição ou o prazo não se vença.
Art. 1.898. A designação do tempo em que deva começar ou cessar o direito do herdeiro, salvo nas disposições fideicomissárias, ter-se-á por não escrita.
IV - Modal: é a cláusula que tem encargo ou ônus, ou seja, possui uma pequena contraprestação a ser cumprida pelo sucessor (ex: Quincas Borba); o encargo é imposto nas liberalidades como nas doações e testamentos. O descumprimento do encargo pode levar o herdeiro legítimo a pedir a anulação da herança a fim de beneficiá-lo. Condições e encargos ilícitos e imorais são nulos.
Veja mais encargo na aula 13 de Contratos (1.938).
Art. 1.938. Nos legados com encargo, aplica-se ao legatário o disposto neste Código quanto às doações de igual natureza.
A legítima do herdeiro necessário não se sujeita a condição ou encargo.
V - Motivada: o testador indica as razões pelas quais está beneficiando aquela pessoa (1.897, in fine). Tal motivação é dispensada pela lei, o testador indica se quiser, porém eventual motivação equivocada pode anular a cláusula testamentária (art. 140).
Art. 1.897. A nomeação de herdeiro, ou legatário, pode fazer-se pura e simplesmente, sob condição, para certo fim ou modo, ou por certo motivo.
Art. 140. O falso motivo só vicia a declaração de vontade quando expresso como razão determinante.
Cláusula de inalienabilidade (CI):
O saudoso Orlando Gomes chama com razão essa cláusula de “anacrônica, violenta, polêmica e antipática”. Trata-se de uma cláusula restritiva que implica também em impenhorabilidade e incomunicabilidade, ou seja, se o testador deixar seus bens com essa cláusula, tais bens não poderão ser vendidos ou doados pelo herdeiro (inalienáveis), não poderão ser tomados pelo credor do herdeiro (impenhoráveis), e nem se transmitirão ao cônjuge do herdeiro (incomunicabilidade, 1.911).
Art. 1.911. A cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de liberalidade, implica impenhorabilidade e incomunicabilidade.
Parágrafo único. No caso de desapropriação de bens clausulados, ou de sua alienação, por conveniência econômica do donatário ou do herdeiro, mediante autorização judicial, o produto da venda converter-se-á em outros bens, sobre os quais incidirão as restrições apostas aos primeiros.
Conceito: é um meio de gravar o próprio bem em relação a terceiro beneficiário, que não poderá dispor dele, gratuita ou onerosamente, recebendo-o apenas para usá-lo e fruí-lo.
A CI não pode ser imposta aos bens do testador, pois não podemos gravar os nossos próprios bens, mas apenas os bens que transferimos a terceiros por doação ou herança.
A CI não é obrigatória, mas uma vez presente no testamento a propriedade sobre os bens herdados ou legados fica limitada.
A CI dura no máximo uma geração, então não atinge os filhos do herdeiro. O herdeiro ou legatário poderá usar, alugar e emprestar estes bens, mas não poderá vendê-los, ou seja, tais bens ficarão fora do comércio.
Sub-rogação: excepcionalmente o juiz pode autorizar a venda, mas o produto da alienação continuará gravado (§ 2º do 1.848 e pú do 1.911). Assim trocada a coisa, o novo bem fica sub-rogado na inalienabilidade imposta pelo extinto. O art. 1.109 do CPC dá muito poder ao juiz, mas é preciso usar essa força com razoabilidade.
Artigo 1848 ...§ 2o Mediante autorização judicial e havendo justa causa, podem ser alienados os bens gravados, convertendo-se o produto em outros bens, que ficarão sub-rogados nos ônus dos primeiros.
Artigo 1911 - Parágrafo único. No caso de desapropriação de bens clausulados, ou de sua alienação, por conveniência econômica do donatário ou do herdeiro, mediante autorização judicial, o produto da venda converter-se-á em outros bens, sobre os quais incidirão as restrições apostas aos primeiros.
CPC - Art. 1.109. O juiz decidirá o pedido no prazo de 10 (dez) dias; não é, porém, obrigado a observar critério de legalidade estrita, podendo adotar em cada caso a solução que reputar mais conveniente ou oportuna.
Pode a CI incidir sobre os bens da legítima (1.846), mas exige justa causa (1.848), cabendo os herdeiros questionar judicialmente a “justiça” dessa causa, afinal o falecido pode estar apenas atrapalhando a vida de filhos que não pôde excluir da herança.
A causa deve ser clara e objetiva (ex: filho perdulário, toxicômano), não se admitindo: “deixo uma casa para meu filho com a CI pois não gosto da esposa dele...”
Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.
Art. 1.848. Salvo se houver justa causa, declarada no testamento, não pode o testador estabelecer cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade, e de incomunicabilidade, sobre os bens da legítima.
§ 1o Não é permitido ao testador estabelecer a conversão dos bens da legítima em outros de espécie diversa.
§ 2o Mediante autorização judicial e havendo justa causa, podem ser alienados os bens gravados, convertendo-se o produto em outros bens, que ficarão sub-rogados nos ônus dos primeiros.
A CI precisa estar inscrita no Cartório de Imóveis para ter eficácia plena e ser de conhecimento público. Se os bens herdados forem móveis (ex: uma jóia), a CI é inoperante, pois os bens móveis, salvo os veículos, não se sujeitam a um registro organizado como os bens imóveis.

Fonte: www.rafaeldemenezes.adv.br/

Nenhum comentário:

Postar um comentário